“Olhos de cigana oblíqua e dissimulada. Eu não sabia o que era oblíqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me perguntava o que era, se nunca os vira, eu nada achei extraordinário; a cor e a doçura eram minhas conhecidas.” 

Quem não conhece essa denominação diferenciada dos olhos de uma moça está vivendo errado. Mas quem sabe você talvez reconheça por olhos de ressaca. Ou então já tenha ouvido falar na questão mais importante dos livros e que ninguém sabe realmente responder: Capitu traiu ou não Bentinho? – Eu particularmente acho que não, caro leitor, mas deixemos essa no ar. 

O autor desses marcos na literatura, em apenas um livro, foi Machado de Assis, escritor brasileiro. Com ele, damos início à nossa nova série: dádivas brasileiras – e vamos combinar, nós temos muitas. 

Joaquim Maria Machado de Assis era geminiano e isso já responde muita coisa de nossas questões – tô brincando, geminianos, paz e amor aqui no 9noandar. Ele morreu aos 69 anos depois de uma vida cheia de obras. “Por que começar este perfil falando sobre a morte dele?”, você deve estar se perguntando. Mas que jeito melhor de falar do escritor senão usando seu próprio modo de escrever? A ordem não cronológica dos textos pode causar confusão – digo por experiência própria -, mas é um bom jeito de contar uma história.

“Expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. […] Morri de uma pneumonia; mas se lhe disser que foi menos a pneumonia, do que uma ideia grandiosa e útil, a causa da minha morte, é possível que o leitor me não creia, e todavia é verdade.”

Viram, não existe jeito melhor de começar a contar sua história – seja do fim ou seguindo uma ordem não linear, quem sabe. Dizem que morreu de arteriosclerose generalizada, incluindo esclerose cerebral. Não se preocupe, tentaremos explicar essas palavras complicadas. Vamos começar pela segunda, que é um pouco mais conhecida por nós meros mortais.

Esclerose cerebral são lesões no sistema nervoso central. A pessoa com essa doença apresenta formigamentos e transtornos de sensibilidade, que mais pra frente se assemelham mais com pressões ao redor do tronco ou descargas elétricas. Além disso, há também a perda de força nos pés e nas mãos. Já a arteriosclerose é a dificuldade que as artérias têm em expandir, causando um certo bloqueio no fluxo sanguíneo. 

Parando com a aula de medicina, voltamos agora a falar sobre Machado – Machadinho pros íntimos. O homem escrevia demais, tanto que no final da carreira ele tinha publicado dez romances, dez peças teatrais, duzentos contos, cinco coletâneas de poemas e sonetos e, choquem, mais de seiscentas crônicas. É bastante coisa se considerarmos que o acesso à educação era limitado para ele por causa do racismo

Machado nasceu em família carente, porém letrada, por isso ele era capaz de ler e escrever, mesmo com as dificuldades da época. Além disso, ele era também jornalista e começou a trabalhar logo cedo na Tipografia Nacional. Vivia pela escrita e fez isso até passar dessa para a melhor. A última obra que lançou ainda vivo foi Memorial de Aires, publicada inclusive no ano de morte do autor. 

“Quem parecia contente de tudo, palavras e silêncios, era a dona da casa. Posto me desse a principal atenção, não o fazia em maneira que esquecesse a tela e os filhos. Mirava a tela e falava aos filhos com a ternura velha que já estou cansado de notar, e talvez a ternura fosse agora maior que de outras vezes; pelo menos, trazia certo alvoroço como de alma que soletra uma felicidade nova ou inesperada.”

E quem acha que ele parou por aí está enganado. Suas obras continuaram a ser lançadas até 50 anos depois da sua morte. Literalmente, a última foi lançada em 1958. Mas os livros mais reconhecidos do autor são os chamados da Trilogia Realista. Memórias Póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba e Dom Casmurro foram os livros que introduziram o realismo no Brasil na segunda fase do autor. A primeira foi marcada pelo Romantismo.

Romantismo x Realismo

Os séculos 18 e 19 foram marcados pela ascensão da burguesia em algumas partes, substituindo a elite absolutista que estava enraizado em alguns países. Junto a isso, nasceu o movimento Romantismo, que ressaltava nas obras os valores burgueses. Entretanto, nem só de dinheiro se vive – entendeu? – e o movimento romântico carregava outras características muito mais presentes. Não, não era totalmente o mesmo significado daquele  que nós conhecemos hoje. 

Para reconhecer uma obra romântica, os principais atributos eram: – O egocentrismo; – Sentimentalismo exacerbado; – Nacionalismo; – Idealização da mulher amada; – O tom depressivo e a fuga da realidade, fosse pela morte, pelos sonhos ou pela arte. 

Já o realismo era o contrário. Apesar de ter surgido também no século 19, ele veio como oposição ao movimento anterior. Nessa época, Darwin lançou o livro A Origem das Espécies, que explicava sobre a seleção natural. Além disso, surgiu também o Darwinismo Social, onde o indivíduo é determinado pelo meio em que vive. O eurocentrismo continuava forte. A Segunda Revolução Industrial chegava na Europa, e assim eles eram “denominados” como seres superiores por causa da tecnologia. 

Por causa disso, os realistas adotaram a ciência como carro chefe do século, substituindo a idealização e anseios de liberdade por uma postura completamente oposta e focando em uma realidade que se transformava diariamente. Para reconhecer uma obra realista, deve-se prestar atenção se: – Há a valorização da objetividade e dos fatos; – Impessoalidade; – Descrição de coisas típicas; – Frequentes críticas à moralidade da burguesia; – Linguagem culta e estilizada; – Tentativa de falar sobre o real e abordagem psicológica dos personagens. Hora de me dar o diploma de especialização em literatura, só acho. 

Mas voltando a Machado de Assis, as obras dele foram o ponto de início de muitos autores como Carlos Drummond de Andrade, Olavo Bilac, Lima Barreto e uma outra infinidade de pessoas. Foi o pioneiro em abordar temas sociais no Brasil, por isso alcançou patamares de prestígio tanto no território brasileiro como em países vizinhos. 

Outros feitos

Como escritor, Machado ficou muito reconhecido por toda a sua geração e perdura até hoje nas leituras essenciais. Porém, ele também foi um dos idealizadores da Academia Brasileira de Letras e presidente da instituição. Para reafirmar sua importância, existe um busto dele em Lisboa, Portugal e uma estátua de corpo inteiro em Madrid, Espanha. O principal prêmio literário brasileiro tem o nome do autor. Machado é considerado também um dos grandes gênios da história da literatura, sendo colocado ao lado de Shakespeare, Dante e Camões. José Veríssimo o nomeou como “cume da literatura nacional”. Não é pouca coisa não, meus amigos. 

“Aí tem o leitor em poucas linhas, o retrato físico e moral da pessoa que devia influir mais tarde na minha vida; era aquilo com dezesseis anos. Tu que me lês, se ainda fores viva, quando estas páginas vierem à luz, – tu que me lês, Virgília amada, não reparas na diferença entre a linguagem de hoje e a que primeiro empreguei quando te vi? […] Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida”. 

Sites de apoio: Mundo Educação, Wikipedia, Brasil Escola

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